sexta-feira, 12 de julho de 2013

Capítulo 6- Mentido para si mesma

 Mentindo para si mesma
-Olá novamente. – Disse a rainha para o zelador dos cavalos ao chegar a estribaria, vinda de sua escapadinha no meio de sua festa de coroação.

-Olá alteza – o rapaz foi receptivo, afinal, estava falando com sua rainha -, vejo que se demorou no passeio. Algo deu errado? Eu devia ter mandado os seguranças te acompanhar. Perdoe-me.

- Orson, eu realmente não precisei de guardas – ela gostava de tratar seus empregados pelo nome, ao invés de considera-los apenas subordinados -, eu sou uma mulher forte. Você me conhece desde que eu era uma plebeia. Não precisa temer a minha presença. Nunca me esquecerei de onde vim.
- Obrigado, rainha Luna.

- Você pode me chamar de Luna, apenas Luna. – E sorriu. Ela era realmente encantadora. Não havia pessoa que não ficasse cativada em sua presença e era por isso que era amada pelo povo, mas era também por isso que Flora a odiava tanto: inveja.

O sol estava quase se pondo. A festa ainda estava acontecendo? Será que os convidados e, pior, seu marido, o rei, haviam notado a sua falta?

-Escute Orson. – Luna, inquiriu novamente o zelador.

-Sim rainha Luna, ops... Sim, Luna. – O rapaz deu um sorriso envergonhado.

- Você sabe se os convidados já se foram? – Ela demonstrava estar um pouco preocupada, não queria arrumar encrencas com o rei.

-Não tenho certeza, mas acho que ainda estão no castelo lady Luna. Não penso que se irão embora hoje. Como bem deve saber, é costume que passem a noite no castelo.

-Muito obrigado pela informação meu bom rapaz. – E pôs-se a retirar alguns fiapos de grama e gravetos que se prenderam em seu vestido verde claro. Agora sua roupa não estava mais tão bem arrumada se comparada ao momento de quando saiu a cavalgar.

Despediu-se do rapaz que guardava o cavalo e alimentava-o. Correu para o castelo o mais rápido que pode sem que ninguém a notasse, passando por trás de caixas e cavalos no meio das vielas. Cruzou o pátio central, onde havia a escadaria do enorme castelo e contornou por trás deste, entrando pela porta dos empregados. Sem prestar muita atenção à sua frente, esbarrou-se com Linetty, uma serviçal conhecida de Lua, caindo ambas no chão e derrubando as taças de cristal, que esta carregava em uma bandeja de prata. Foi uma barulheira daquelas. Era a ocasião perfeita para Lua pedir outras roupas para se vestir. Mas não precisaria mentir muito: Linetty e Luna eram amigas há muito tempo.

            - Me desculpe. – a criada, vestindo seus trajes de serviçal do castelo, estava realmente envergonhada, até notar que era a rainha com quem havia esbarrado.

- Mas não é nada, sou eu, Linetty.

-Ah! Mas mesmo assim lhe devo desculpas. Mas você estava correndo? Parece que está se escondendo de alguém.

As duas conheciam-se mesmo antes de a plebeia se tornar rainha. Ambas costumavam sair para cavalgar juntas e se metiam em travessuras juntas. Esta foi a primeira amiga que Lua fez ao chegar naquele reino. Assim que se casou e se tornou rainha, prometeu à amiga que a tornaria sua serva, apenas para poderem ficar juntas por mais tempo. Linetty era uma pessoa muito carismática e divertida, fazia Lua rir sempre. As duas eram boas amigas.

- Olha Linety, não posso te explicar agora, eu estava apenas dando um passeio. Mas me arrume um vestido limpo, este está sujo por causa do tombo que tivemos. – E riu de maneira dissimulada.

- Já volto, então. Vou buscar em seu quarto. Que tipo de vestido você prefere?

-Me traga um vestido de recepção de convidados. Vá correndo. – Lua falou baixo para não ser ouvida.

A criada real subiu as escadas, muito rápido. O castelo já estava escurecendo e então, pegou uma lamparina que estava pendurada em uma parede dos corredores. Correu para o quarto da rainha. Ao entrar no quarto, viu que o chão estava molhado, perto da janela. Ficou curiosa sobre isso, mas ignorou o fato, sua amiga estava precisando daquele vestido com pressa. Fechou a janela, mais tarde voltaria para secar aquilo.

-Aqui está, Luna. – enquanto ajudava sua amiga a vestir o vestido na cor bordô, que recaía sobre o corpo da rainha ressaltando cada curva, tornando-a mais linda ainda e valorizando seu busto, Linety questionou-a. - Você deu uma escapadinha para cavalgar não é mesmo?

- Sim... Aqueles reis e rainhas estavam me deixando entediada.

-Mas nem me chamou, amiga! – Luna e Linetty tinham uma relação muito próxima e qualquer um estranharia o jeito que a criada falava à sua rainha, mas elas não, pois eram quase irmãs.

- Me desculpe, foi meio de repente. Prometo que saímos juntas na próxima vez. – Ela olhou para a amiga e lhe deu um abraço e um beijo no rosto claro, onde caíam alguns fios loiros de cabelo. – Me diga, os convidados ainda estão ai?

- Estão sim. Mas vão embora somente amanhã. Você não sabe disso?

- Eu esqueci... Obrigado Linety. Ah, pode preparar um banho para mim? Sei que quase nunca peço, mas hoje estou um pouco cansada.

-Sim, queer! – E ambas riram.

Lua retirou-se e passou ao próximo salão, que já estava com as lamparinas acesas, já que a noite caía. Ao passo que caminhava, terminava de ajeitar seu vestido que a deixava mais linda e contrastava com sua pele branca. Foi quando quase tropeçou em um brutamonte caído no chão.

-Mas o que você está fazendo aqui Sun!

O rei estava caído no chão. Perto dele havia vômito e uma taça que derramava vinho. Lua já imaginava o que havia acontecido e não era a primeira vez, já imaginava isso. Como havia previsto antes, o Ser de Poder havia se embriagado mais uma vez. Ela não gostava de quando ele se embriagava daquela forma. Por um momento parou e ficou olhando o homem e passou a conversar consigo mesma. Aquela não era mais apenas a visão de um homem bêbado, representava muito mais.

“Ele bem que poderia considerar como eu ficaria em relação a isso. Eu não consigo, mas mesmo quando ele não está bêbado, é assim que eu o vejo: um indivíduo sem pudor. Eu bem que queria ter uma vida feliz com ele. Sei que tenho que me acostumar com algumas das características da pessoa que eu amo. Mas eu não consigo. Amo-o realmente? Eu também tenho minhas particularidades que devo respeitar antes de tudo. Se ele quer manter uma relação comigo, tem que aprender respeitá-las também. Um homem bêbado caído no chão: é com isso que quero continuar casada? Poderei eu amá-lo a ponto de perdoar suas bebedeiras? Não sei por que ele começou a beber tanto. Antes ele apenas bebia ‘socialmente’. Tenho que por um fim nisso. Conversaremos sobre isso quando ele acordar”.

Uma lágrima escorreu do rosto da rainha enquanto ela chamava alguns empregados para levar o moribundo para seus aposentos reais, onde dormiria por dois dias. Os seres mágicos ficavam muito tempo sem dormir: utilizavam mágica para repor suas energias. Estes precisavam ficar acordados para manter suas atividades em regularidade. Mas Sol precisava dormir sempre devido às bebedeiras que lhe gastavam as energias. Ela era uma pessoa muito emocional e gostava de refletir consigo mesma sempre, exatamente como fazia agora.

“Não é apenas para manter a aparência. Não quero apenas fingir uma relação feliz. Quero ser respeitada. Sei que tenho meus defeitos. Mesmo sendo uma divindade, tenho emoções, afinal, quando você possui um coração – no sentido dos sentimentos – todos os sentimentos passam a conviver com você. Não consigo fingir, mas não posso quebrar o coração do Sol, pois ele ficaria muito furioso: não quero começar uma guerra mágica agora. Posso até simular para ele, mas não consigo mentir para mim.
Além do mais, ele tem que ser responsável. Tem que manter seus compromissos com a humanidade e suas atitudes não estão correspondentes a seu cargo mágico”.

O rei foi levado ao quarto em uma maca pelos seus servos. A rainha se locomoveu até o salão principal. Não encontrou ninguém. Onde estariam os simples que se chamam de nobres? Já teriam se recolhido? Lua encontrou Darwin descendo as escadarias.

Darwin descia as escadas. Ele havia ajudado a despir o rei para que pudesse deitar-se e repousar de sua embriaguez. Darwin era um homem muito elegante, era o humano mais próximo do rei. Este era um filho de nobres de outros reinos que, ouvindo falar das riquezas do reino do Sol, resolveu entrar para sua cavalaria, passando pelos testes apropriados e trazendo consigo uma carta oficial, comprovando ser um ilustre sangue azul. Além disso, ele tinha segredos que escondia de sua família e queria estar longe quando resolvesse revela-los. E seus segredos estavam para serem revelados. Esperaria a hora certa.

-Darwin, olá! Você tem notícia dos convidados?

- Olá, minha rainha. – Ele tinha um olhar malévolo e muito desconfiado em relação a tudo. - Eles estão em seus aposentos. Irão embora após o almoço de amanhã.  – O cavaleiro respondeu gentilmente.

- Muito obrigado pela informação. – E continuou a subir as escadas quando ouviu o homem arguindo-a.

- A propósito, reparei que a senhora não estava presente no fim do encontro de hoje. – A discrição de Lua foi quebrada.

-Eu tive que sair para ver uma amiga doente. – Lua estava nervosa.

- Que amiga? – Ele continuava questionando-a, na tentativa de desvendar aquela aparente mentira.
- Uma amiga que, você com certeza não conhece. Oras, estou cansada – estava percebendo um tom muito irônico na voz do rapaz-, vou me retirar. Até mais Darwin.

- Tenha um bom descanso rainha. Eu já despi o rei, ele não estava nas condições de fazer isso sozinho.

A rainha ouviu e tornou a ascender às escadas. Mas que servo mais insubordinado. Questionava a sua própria rainha como se ela estivesse escondendo algo, e na verdade estava. Mais do que uma simples cavalgada, escondia dentro de si sua própria infelicidade. Naquela noite, Luna passaria todo o tempo em sua banheira com água quente, já preparada por sua serva e amiga Linetty.

Entrou no seu quarto e viu Sol esticado em sua cama gigante, expondo seus glúteos lisos. Darwin podia ao menos tê-lo coberto. Não se sentia confortável com a atitude do cavaleiro de despir Sol, mesmo sendo homens. Ele estava realmente bêbado e seu bafo de álcool incomodava a linda mulher. Tirou seu vestido escuro, acendeu algumas velas aromáticas para aliviar o fedor de seu marido e se dirigiu ao banheiro da suíte real.

A noite chegou e agora Lua estava sentindo suas energias gastas durante o dia sendo reativadas. Era durante o período noturno que ela se tornava mais forte e sua mágica passava a fluir melhor em suas veias. Afundou-se na banheira e começou a meditar sobre seu encontro com o homem dos mares e esboçou um sorriso. Aquele Ser de Poder era muito simpático e agradável de conversar. Lua imaginava que podia ter feito amizade com Mar muito antes. Apesar de ser muito carismática e gentil com todos, ela não tinha muitos amigos mágicos: preferia a companhia das estrelas, suas fadas.

Lua submergiu-se na banheira e lá ficara. Seu corpo era lindíssimo e macio, cada curva delicadamente desenhada pelos deuses. Seus dedos do pé, muito delicados afloravam na superfície líquida da banheira, cobertos de espumas. Ela estava excitada e começava a se acariciar o próprio corpo, como que apreciando cada relevo de seu corpo feminino. Passava os dedos finos da mão direita em seus mamilos, deixando-os rígidos. Em alguns momentos deixava escapar gemidos baixos, como que um gato noturno a espreita de diversão. Com a outra mão atritava suas partes sexuais. Pensava na figura de um homem muito atraente e másculo, Mar. Em êxtase e, totalmente submersa na enorme banheira, passava a mão pelo pescoço e na nuca enquanto acariciava-se em busca de prazer . Finalmente um último gemido a trouxe ao êxtase.

Não estava totalmente satisfeita, queria uma pessoa de verdade ali. Com os olhos fechados lembrava-se de quando fora “resgatada” por Mar, que pensou que ela era uma mulher afogando-se no lago. Em sua tela mental conseguia se lembrar daquele homem nu, com o corpo totalmente sem pelos, praticamente um deus grego. Recordava-se das conversas que tiveram. Estava usando em seu pescoço o colar com o pingente de concha que ganhara de presente do príncipe das águas. Queria reencontrar aquele Ser de Poder e perpetuar aquela amizade, mas não tinha certeza de que Sol iria aprovar. Após o pequeno momento de nostalgia, entristecera-se. No quarto havia um homem bêbado e violento, que não tinha certeza se amava realmente. Logo a banheira estava cheia de pérolas.

Suas energias estavam revigoradas pela sua magia noturna, mas mesmo assim queria dormir. Era no sono que se esquecia por um breve momento de suas preocupações e aflições. Não saiu da banheira para dormir. Ali mesmo dormiu, debaixo da água, sem precisar respirar. Seu cabelo agora flutuava na água, sobre sua cabeça. Abriu os olhos e notou a janela aberta. Pôde ver a lua lá fora, que distribuía para dentro do cômodo sua luz prateada, banhando a mulher com pulsos de energia mágica. Fechou os olhos e dormiu.

Imagem representando Luna


Dayvid Fernandes - O Autor
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