No fundo do lago
O reino todo estava esperando pela volta do
rei e da nova rainha, que haveria de passar pela cerimônia de posse e benção do
padre. Nos
campos verdes era possível avistar a carruagem de Lua e Sol. Uma carruagem de ouro.
Sol era muito exigente quanto às suas riquezas e tudo o que possuía era sempre
adornado por alguma pedra preciosa ou metal raro.
Uma multidão de gente estava esperando o casal
real nos portões do castelo. Lançavam pétalas de flores e desejavam felicidade
e vida longa ao rei e à rainha.
-Viva o Rei e a Rainha! Viva! -O povo
realmente parecia feliz.
No meio daquela multidão Lua conseguiu
enxergar uma mulher com seios fartos e decote exuberante em um vestido escuro
de camponesa. Seus olhos arregalaram ao vê-la. Flora olhava firmemente nos
olhos da rainha Luna e em sua mente lançava toda sorte de maldições,
desejando-lhe todo o mal.
Inconscientemente Lua apertou firme o braço de
Sol, que estava acenando ao povo.
-O que há Luna, algo te incomoda? – Sol continuava
sorrindo para o povo.
- Não, me desculpe, não é nada. – Sua voz
baixa e preocupada a delatava.
O casal acenava e sorria para o povo, que
lançava pétalas e flores sobre o caminha da carruagem. A rainha olhou para trás
e lá estava ela, tinha certeza! Era Flora que estava ali com um sorriso malfazejo
em seu rosto. O povo gritava de felicidade pela rainha.
A cerimônia de posse não demorou muito. Lua
estava muito feliz, já que iria ajudar o povo plebeu. Foi coroada com sua coroa
de ouro e pedras preciosas. No salão do Trono muitas pessoas sorriam para a
rainha.
Ao término ouve um grande almoço real. Reis,
rainhas, príncipes, nobres e pessoas de cargos importantes de todas as
redondezas estavam naquela festa, e traziam consigo presentes como perfumes, joias
etc. Lua não ligava muito para presentes. Ela se doava mais do que gostava de
receber. Não saia de sua cabeça a imagem daquela víbora psicopata. O que Flora
ainda estava fazendo em seu reino? O que estaria ela planejando? Flora não fora
convidada para o casamento, mas mesmo assim apareceu e ainda trouxe consigo
barris de vinho. Era bem provável que eles estivessem envenenados. Flora
gostava de trabalhar em surdina, não seria capaz de um escândalo desses.
Todos os nobres se reuniram em uma enorme
sala. Uma mesa gigante se colocava ao centro do lugar. Janelas se colocavam ao
alto do salão. A mesa era tão grande que dispunha de aproximadamente cinquenta
acentos macios. Os nobres de outros reinos admiravam a beleza e riqueza do
castelo do rei anfitrião. Havia muita comida e muito vinho, a principal bebida
dos nobres naquele reino. Os criados se colocavam ao redor da sala, sempre
prontos a repor os alimentos na mesa e repor as bebidas nas taças de seus
senhores.
-E então Majestade Sun, está feliz com o seu casamento?
– um príncipe do Reino do Sul sorria enquanto bebia uma taça de vinho tinto.
-Estou muito feliz! Eu amo minha esposa. Sei
que não é costume dos nobres, este tipo de casamento. Mas Luna me encantou
desde o primeiro dia que a vi e pretendo fazer de tudo para que ela seja feliz.
– Rei Sun falava com voz firme enquanto se dirigia a todos os convidados.
-Eu serei uma ótima rainha– com sua
graciosidade a rainha Luna falava de pé-, e honrarei a casa de meu marido, o
rei Sun. Serei uma ótima rainha para meu povo. Proponho um brinde para o Reino
do Sol!
Todos se levantaram com suas taças de prata e
brindaram! A comilança e bebedeira prosseguiu a tarde inteira. A maioria dos
homens ficou à mesa bebendo vinho e conversando sobre mulheres, guerras e
impostos, enquanto as mulheres se reuniram em outra sala para beber os chás
preparados com ervas do campo. Era uma sala redonda com as paredes lotadas de
janelas grandes com vidros coloridos. Ao seu centro uma mesa, também redonda
era circulada por várias cadeiras estofadas no tom vermelho e de espaldar alto.
- Rainha Luna. O povo plebeu deve estar muito
instigado por ter uma plebeia no trono! – A Rainha Bethany, do Reino do Oeste
falava em tom irônico.
Lua amava os humanos, mas simplesmente não
suportava alguns deles, principalmente os nobres e clérigos, que geralmente se
achavam superiores.
-A nobreza está no coração de quem a possui,
rainha. - Sorriu falando, enquanto levava a sua pequena xícara à boca.
Bethany levantou as sobrancelhas, porquanto
não acreditava que uma simples plebeia possuía aquela sabedoria. As outras
rainhas deram risinhos, pois de todas elas, a mais insuportável era aquela
rainha mesquinha.
-Vejo que você é uma mulher muito sábia –
Susie, rainha do Oeste falava -, espero que seu rei aproveite esta sabedoria
para governas este reino. Ela acenou e pediu que uma das criadas que estava na
sala enche-se novamente sua xícara, mas dessa vez com outro tipo de chá.
-Eu também espero. – E sorriu para todas as
rainhas naquela sala, que passavam de cinco. Lua era a mais nova delas e também
a mais encantadora. Era invejada pelas outras rainhas, pois era bela, jovem,
sábia e muito bem educada por ser uma plebeia, sem contar que seria a mais
rica. O Reino do Sol era o mais rico de todos. Lua quis mais chá, mas encheu
por si mesma a sua xícara.
Mais tarde, Luna já estava se cansando daquela
ladainha fútil que as outras rainhas conversavam e então resolveu pegar um
cavalo e ir cavalgar pela floresta.
-A senhora vai sair milady? – o jovem cuidador
dos cavalos dizia – Quer que eu lhe arranje um guarda?
O estaleiro do rei era imenso, possuía
centenas de cavalo. Cavalos de guerra, cavalos de passeio, cavalos para jogos.
As melhores raças. Eram todos bem tratados e fortes.
- Não será necessário meu jovem. – Lua falava
em tom agradável com o jovem.
- A senhora tem certeza? – Ele estava
desconfiado.
-Tenho sim meu jovem. Pegue essas moedas de
ouro e não diga a ninguém que saí, está ok?
-Sim claro. E a propósito, a majestade está
muito linda, como sempre.
Lua vestida um vestido de cor clara, próxima
ao verde e exalava um cheiro de mirra muito agradável que encantava a todos.
- Obrigada pelo elogio jovem. Até mais! – E
cavalgou muito rápido, parecia voar montada no cavalo.
Foi-se pelos portões de trás do castelo, não
queria ser vista por todos. Aquele era um dia de festança e todos esperavam que
ela estivesse na comemoração, recepcionando os outros nobres. Lua não os
suportava. Estava começando a sentir saudades da simplicidade que tinha quando
vivia com o povo do campo, de quando lia lendas nórdicas para as crianças
pobres, de quando ensinava as moças mais jovens a costurar, de quando se
disfarçava de homem para ir às batalhas e salvar vidas, de quando fazia
remédios com ervas e outras especiarias para os velhos e doentes. Era
praticamente uma curandeira no seu vilarejo.
O vento soprava forte aquele dia. Cavalgou por
um caminho que era seguido por muitas árvores com flores na cor amarela. Mais
alguns minutos e adentrou na Floresta do Sol e se alegrou com o verde das
árvores e com o amarelo e laranja das folhas de algumas espécies de árvores e
com o colorido das poucas flores que encontrava hora ou outra. O sol ainda
brilhava no céu e a rainha raciocinou que deveria voltar antes do anoitecer,
para que não sentissem sua falta. No castelo os homens ainda bebiam e o rei Sun
provavelmente desmaiaria bêbado e seria levado para a cama pelos serviçais. Sol
era um beberrão.
Desceu de seu cavalo marrom e acariciou-o no
rosto e conversou um pouco com ele, seu poder era maravilhoso e até os animais
se sentiam bem na sua presença.
- Eu não sei como você consegue passar a vida
inteira carregando em suas costas largas este bando de nobres gordos e altivos.
Desculpe-me por montar em você criaturinha linda!
O cavalo pousara sua cabeça no ombro de Lua,
parecia entender as suas palavras. Ela trançava os dedos na clina do cavalo
enquanto cantava uma canção antiga, que acalmou o animal. Quando terminou de
cantar aquela musica mágica, o cavalo já estava deitado no chão e dormia. Ao se
virar, notou que ao seu redor, nos galhos de arvores e no chão os pequenos e
médios animais, como alces, esquilos e pássaros estavam todos a admirando. Lua
riu.
A lady tomou um rumo entre as árvores e adentrou
o bosque, não cantava mais, apenas cantarolava com a voz baixa, não queria
chamar a atenção dos animais. Colheu alguns frutos e os colocara na sexta que
trouxera. Não colheu as flores, ela não gostava de recolhê-las: o amor pelas
flores estava em admirá-las e não e possuí-las. Em colher uma flor, ela morre.
Caminhou pela floresta até que encontrou um
pequeno lago. Despiu-se totalmente de suas roupas e entrou ao lago. Sem querer
deixou as frutas caírem dentro da água, não se importou muito. A água estava
morna, ela gostou. O lugar era todo rodeado por árvores e as borboletas voavam
sobre o rio. Lua mergulhou na água e desceu até o fundo da água. Com seus
poderes mágicos prendeu a respiração e assim não precisou subir para respirar
novamente. Abriu os olhos e passou a observar aquele bioma aquático. Havia
alguns peixinhos acinzentados e outros um pouco coloridos. Aquelas águas eram
muito claras e azuladas, uma maravilha da natureza.
As correntes de água acariciavam a pele de
Lua. Ela começou a se conectar com a natureza e se sentiu completa, a deusa da
lua adorava nadar, ela adorava os rios e o mar. Fechara os olhos naquela conexão e sentia a energia positiva fluir da água para si e energia negativa
indo embora.
Lua nadava por toda a extensão do lago e, se
não fosse sua forma humana, se poderia dizer que era um peixe, ou uma sereia. A
ex-plebeia começara a sentir algo que, inexplicavelmente nunca havia sentido.
Sentia uma conexão muito forte entre ela e aquelas águas, como se fosse a
própria água, como se fosse parte integrante daquele lago. Lembrou-se do
panteísmo, filosofia que considera cada indivíduo como parte de um todo, um
todo que é a natureza, um todo que é o todo divino.
Parou de nadar. Sentou-se no fundo do lago na
posição de lótus e ali ficou por uns dez minutos a explorar aquela coisa boa de
que, em seus bilhões de anos, nunca tinha sentido. Seu corpo começou a emitir
luz própria e agora ela era uma mulher de luz prateada. Seu corpo estava se
transformando em energia pura, toda sua massa humana estava se transformando em
energia. Aquela luz se espalhou pelo lago todo e ele parecia uma cratera de
luz. A energia concentrou-se novamente no mesmo espaço e Luna voltou à forma
humana.
Aquilo foi lindo. O riacho agora estava mais
puro do que antes e os peixes mais saudáveis, livre de todas as enfermidades.
Aquela água agora era mágica e presentearia com boa saúde aqueles que dela
provassem ou nela sobrenadassem.
Lua se preocupou, porque não devia ser vista
por nenhum humano em seus atos mágicos. Abriu os olhos, ainda dentro da água e
olhou para cima. No alto da superfície viu uma imagem de homem. Será que ele a
tinha visto transformando-se em luz? Em menos de um segundo ela viu aquele
homem retirando sua camisa e sua calça e pulando na água. No próximo segundo
ela se sentiu agarrada por braços grossos e sendo levada para a o alto do lago.
Quem era aquele homem branco e forte e nu que
a segurava? Seus cabelos estavam na altura do ombro. Sua barba estava por
fazer. Olhos azuis e profundos como nenhum outro. Seu corpo era todo esculpido,
como só um membro do exército real teria. Lua olhou para sua cintura e pôde ver
o “órgão de baixo” homem. Sentiu-se excitada, mas conteve-se educadamente. Mas
que homem é esse que não usava roupas de baixo?
- Você está bem? Hey! Fala comigo! – O homem
de voz suave como a brisa do mar, mas mesmo assim muito preocupado, olhava
fixamente para o rosto da donzela e aproximava-se de seu nariz para ouvir sua
respiração- Você está me ouvindo?
Lua estava paralisada diante de tanta beleza. Os
braços do forte cavalheiro as circundavam pela cintura e ela deitava-se em seu
colo, próxima à linha da cintura, e olhava para cima e admirando aquele rosto másculo,
pele perfeita. Nem parecia a pele de um humano.
-Por que você está sorrindo, rainha Luna? –
Ele a conhecia muito bem.
-Me desculpe Mar, é que eu estava meditando e
às vezes fico meio desligada. – Na verdade ela estava anestesiada pelo poder de
encanto do rei dos mares, o Mar. Um homem belo, charmoso, sereno e muito
sensual. Em muitas culturas ele era cultuado como o deus Netuno ou Posseidon.
Mas ele não era um deus e nem queria ser. Era um benfeitor dos humanos.
Lua na Beira do lago
- Você me assustou. Eu estava passando pelas
redondezas para checar a pureza dos lagos e vi uma mulher no fundo da água. Não
tinha noção que era você.
- Você bem sabe que nós podemos ficar de baixo
da água sem respirar. – Ela ainda sorria.
-Eu não sabia que era você. Mas, e a
propósito, você está nua. – Mar virara o rosto para o lado para não ficar
encarando o corpo da mulher. Levantou-se rapidamente e vestiu sua calça preta.
Lua não parava de olhar cada movimento dele - Você não vai se trocar?
Só agora Lua se dera conta de que ainda estava
sem roupas, não estava prestando atenção no que Mar dizia, atentava-se apenas
ao seu corpo. Pulou novamente na água. Suas roupas estavam do outro lado da
margem.
-Você pode pegar minhas roupas, fazendo
favor? - Ela estava muito envergonhada.
Era casada, não podia se entregar assim aos prazeres carnais, mesmo sendo
divinos e concedidos pela Deusa.
Mar, pelo contrário, ria sem parar, ele não
conseguia não rir. Era um homem muito bem humorado.
- Pego sim. Mas não se preocupe, eu não fiquei
te olhando.
Ao entregar as roupas para a agora rainha do
Reino do Sol na Terra, virara-se de costas enquanto ela saia do lago e apanhava
as roupas para se vestir, mesmo molhada.
- Como vai o casamento com o Sol? – Ele falava
de costas- Eu adorei a festa de vocês, havia muita comida, bebida. Você estava
linda.
Mesmo de costas, Mar podia usar seus poderes
mágicos para ver tudo o que queria. Enquanto conversava com Lua, fechou os olhos
e visualizou em sua mente aquela linda mulher a se vestir. Viu que as curvas
dela eram perfeitas. Possuía uma cintura fina e coxas grossas. Seus seios,
apesar de não serem tão fartos como os de Flora, eram exuberantes e muito
belos, sendo atração para qualquer homem. Viu sua virilha lisa, “a caixinha de
joias” como diziam alguns homens bêbados. Em sua mente ele ria, pois achava a
situação engraçada. Ele também a desejava, mas ela era uma mulher comprometida,
tanto no Mundo Mágico como no Mundo dos Simples. Devia se contentar.
- Ah! Vai bem obrigado. – Lua não falara a
verdade – Estou pronta, pode se virar. – Ele se virou para falar de frente com
ela – Obrigado pelo elogio. Todas as roupas cerimoniais foram tecidas pela
nossa melhor alfaiata e nossa comida foi muito dedicadamente preparada pelos
melhores cozinheiros do reino.
- Bem percebi. Estava tudo muito bom – os
olhos azuis de Mar se chocavam com os de Lua enquanto eles dialogavam – e todos
gostaram. Onde passou a sua segunda lua de mel, Lua? – aquela frase soou
engraçada.
- Fomos para o Reino do Sol no Mundo Mágico.
Os dois se puseram a caminhar. Conversavam e
se relembravam dos velhos tempos, quando muitos humanos ainda criam que eles
eram deuses, e os serviam. Ainda naquela época, alguns poucos ainda tinham
essas práticas mágicas antigas, mas eram poucos, estavam sendo caçados,
principalmente as bruxas e bruxos, que não eram pessoas más. Os Seres de Poder,
por piedade, ajudavam quem os clamava nos rituais mágicos.
- Bons tempos, Lua! Eu adorava ser chamado de
Posseidon pelos gregos. – Mar dizia para sua amiga dos velhos tempos.
- Verdade. As minhas representações lunares
ainda têm alguns seguidores. Porém eu não me preocupo com isso, nunca me
preocupei.
-Sempre muito amorosa com os humanos... Digna
de uma deusa!
- Não blasfeme assim, Posseidon! – Lua disse,
e caíram na gargalhada.
Os dois riam como amigos que se conheciam há
anos. Bom, eles se conheciam há milênios, mas nunca foram tão próximos. Eles se
sentaram no meio do bosque que ainda estava sendo iluminado pelo sol que, em
poucas horas estaria se pondo.
- O que você tem feito Lua? – Mar puxava
conversa com aquela linda dama.
-Ah... O de sempre. Tenho realizado meus
rituais lunares para mudança de fase da lua, tenho variado o brilho dela,
influenciado na colheita, vegetação, vida na Terra etc. E você? – Lua estava
interessada, nunca tinha parado para ter essa conversa com aquele simpático
homem – O que tem feito?
- O de sempre. – Ele olhava para baixo quando
respondeu, e levantou a cabeça e fitou-a com seus olhos azuis. Dentro daquele
olhar parecia haver um oceano inteiro de imensidão.
- O de sempre, o quê? Perdoe-me, eu nunca parei
para refletir o que você faz, na verdade eu nunca parei para pensar em...
- Em mim? – Agora ele estava um pouco mais
sério. Mas não uma seriedade ruim.
-Não... É que... – A rainha se encabulou um
pouco.
- Tudo bem. Temos bilhões de anos, mas eu
compreendo que você não me conheçadireito. Você esteve sempre tão envolvida com
os humanos, se doando tanto que nunca parou para pensar em outra coisa.
Lua não respondeu, apenas olhou para Mar, ele
se mostrava tão compreensivo. Seu rosto corava e um sorriso esboçou.
- Talvez você precise me conhecer um pouco
mais. Venha! – o homem aquático segurou sua mão e puxou-a para o voo.
-Aonde vamos? – Lua gostou da ideia.
– Você verá. - E piscou
Em um segundo ambos estavam invisíveis. Com um
pequeno salto estavam voando sobre a floresta. Lua não estava acostumada a
fazer aquilo. Estava habituada a agir como os humanos, estar entre eles,
acostumada em ser eles. Olhou para baixo e viu o imenso carpete de copas de
árvores em tons de verde. Via alguns pássaros voando mais abaixo. Tudo estava
lindo até que...
-Ai! – Luna fora atingida por um pássaro preto
bem no alto de sua cabeça. Viu algumas penas voando e o pássaro caindo, logo
abaixo dela.
- Esqueci que estamos invisíveis, precisamos
ter mais cuidado. – Mar alertou-a – Onde você esta indo? – Ficou sem resposta.
Lua descia em espiral na direção do pássaro
preto que caia. Ela estava aflita de que ele tivesse se machucado. Mesmo com
sua cabeça latejando de dor pela pancada, ainda pensava na dor do pequeno
pássaro. Rapidamente conseguiu apanhá-lo. Subiu no voo para o lado de Mar. O
pássaro estava apenas desmaiado.
Continuaram voando por um pouco de tempo.
Conversavam pouco, apenas se observavam. Seus olhos é que conversavam, se
falavam por sorrisos e piscadelas. O rei dos mares observava como o vento soprava
nos cabelos loiros da realeza da lua. Era como aquela cena do filme Titanic,
ela estava simplesmente linda. Seu vestido esvoaçava-se no vento e em algumas
ocasiões conseguia flagrar as coxas torneadas da mulher que voava ao seu lado.
Ela segurava o pássaro preto em seus braços. Ele não entendia por que ela ainda
o abraçava, bastava-lhe fazer um feitiço de cura e estaria curado. Mas logo ele
entenderia que Lua, mais do que curar o pássaro da dor que sentiu pelo baque,
queria compartilhar com o pobre animal um pouco de carinho, como forma de
perdão por atingir-lhe.
Lua também observava Mar. Era até engraçado e
ria de vez em quando. O rei das águas devia levar-lhe para mergulhar e não para
voar, parecia meio irônica a situação. Ela não entendia por que ele estava
voando com ela. Olhava para ele e via seu cabelo escuro balançar em seu ombro.
Conseguia sentir seu cheiro amadeirado, provavelmente algum perfume vindo do
campo. Não, o Mar não tinha cheiro de peixe, pelo contrário, era um homem muito
cheiroso e vaidoso. Principalmente quando estava passando pelo Mundo dos
Simples. Apesar de que não caminhava por terra com muita frequência, passava a
maior parte do tempo sob o mar ou sobrevoando-o, protegendo as baleias da caça.
Pobres baleias. Era uma raridade esbarrar com ele andando por ai.
Os dois amigos desceram no alto de uma
montanha que Mar indicara. A “veterinária de coração” segurava o pássaro entre
seus braços. Seu vestido verde claro já estava seco. Sentaram-se na beira de um
penhasco. Lá em baixo havia o mar: eles sobrevoaram uma boa parte da região.
Podiam teleportar-se, mas preferiram voar, queriam passar um tempo junto para
conhecer-se, como amigos, é claro.
-E então, por que me trouxe aqui nesta
montanha? Achei que me levaria para o fundo do mar. – Lua dava um beijinho no
bico do pássaro preto que já estava acordado pelo efeito do beijo mágico.
- Eu quero te mostrar o mar, a minha casa,
daqui de cima. Gosto muito desta visão. Parece não ter fim – Ele esticara um
dos braços e apontara para o grande oceano.
- Sua casa? Mas que interessante.
- Sim, eu passo a maior parte do tempo lá em
baixo, quando não estou sobrevoando a imensidão das águas. – Ele falava com
orgulho.
-Mas e o seu Reino no Mundo Mágico?
- Eu quase não vou lá. Na verdade quem fica
mais no meu castelo azul são as sereias. – As sereias de verdade têm pernas
sim, quando querem e enganam a muitos homens e mulheres quando querem manter
relações sexuais. São aquelas mulheres que você só encontra uma vez na vida e
tem a sua melhor noite de prazer e paixão. Aquelas lindas mulheres que na manhã
seguinte terão desaparecido e, levado consigo a sua esperança de encontrar uma
mulher tão boa quanto elas. Mas você poderá vê-las novamente, em seus sonhos.
- Pelo jeito você gosta mesmo do que faz. Não
é em vão que te chamam de homem peixe! – Ambos riram. - O que você faz
exatamente? – Lua ainda estava curiosa.
- Eu salvo os animais dos homens e salvo os
homens da fome. Mantenha a vida da maneira que me é possível.
-Conte-me mais sobre isso – Lua se confundiu
um pouco.
- Eu sustento o ecossistema aquático em
funcionamento. – Mar ficara de pé enquanto falava sobre seus afazeres e Lua
fitava-o atentamente – Acontece que os homens precisam comer e também comem
peixe. Nem todos têm a benção de serem vegetarianos. Mas eu também protejo os
peixes e outros animais da carnificina.
- E como você faz isso? – Lua estava achando
aquele diálogo interessante.
- Quando os pequenos, médios e grandes barcos
lançam suas redes, sou eu quem conduz os cardumes de peixe para as redes, mas
de forma apropriada. Eu não permito que os homens abusem da natureza marinha.
-Você os leva para a morte?
- Eu não vejo assim. A natureza tem um ciclo
natural, e sou eu que balanceio isto em tudo que é concernente ao mundo dos mares
e rios. Fico muito triste em ter que virar alguns barcos cujos donos querem
extrapolar em sua “cota” de pesca.
- Realmente... – Lua se entristeceu um pouco e
acariciou o pássaro preto que estava em seu colo. Ele estava gostando daquele
carinho.
- Eu faço mais! Ajudo os animais a se
procriarem! – Mar se sentou novamente do lado de Lua, só que dessa vez mais
próximo a ela. Lua achou aquilo um pouco estranho- Na época do acasalamento de
cada espécie, inclusive de pinguins, leões-marinhos e baleias, eu os conduzo
para as regiões mais apropriadas para este objetivo. Ou você achou que os
animais se guiavam pelas estrelas para encontrar terras distantes para a
procriação! Teriam eles bússola?
- Eu imaginava que você tinha alguma coisa a
ver com isso. – Lua olhava para o horizonte.
-Eu conduzo as pequenas tartarugas para o mar
da praia, mas nem todas sobrevivem. Eu tenho as mãos atadas quando tenho que
deixar o ciclo da natureza acontecer.
-Você é quase um ecologista! – Lua olhava para
o pequeno voador de penas. – Você tem muito trabalho a fazer, Mar, pelo jeito!
-Tenho sim – Mar olhava para o longe – e esta
noite terei que salvar umas baleias que estão passando perto da costa. Você não
quer me ajudar?
- Sinto muito, mas não posso. Creio que à esta
hora – o sol estava se pondo - a festa no castelo deve estar terminando e, meu
marido vai notar minha ausência. Seria grosseria eu não estar na minha própria
festa.
- Ele não sabe que você está aqui? – Mar
perguntou curioso.
- Não, eu saí escondida. Não suporto os nobres
e toda aquela bajulação! – Lua realmente não gostava de bajulações falsas.
-Bom, é uma pena, eu estava gostando muito de
conversar com você.
-Eu também, mas creio que Sol estará bêbado e
ficará zangado se eu não voltar a tempo para despedir-me dos outros reis e
nobres de sangue azul. – ela fez cara de nojo - Afinal, estão festejando minha
coroação como Rainha do Reino do Sol, aqui na Terra. – Lua não parecia muito
entusiasmada.
-É... Realmente você deve estar lá. Isto é, se
você realmente quiser! – Ele se aproximou um pouco de Luna para falar-lhe -
Nunca faça nada contra sua própria vontade. – O cavalheiro das águas lhe
aconselhava em voz baixa.
- Eu sei, mas não quero brigar mais com o Sol!-
Lua parecia um pouco triste agora.
- Você quer conversar sobre isso? – Ele
realmente era um homem muito gentil.
- Não, obrigado... Eu realmente preciso ir.
- Ok, mas antes de você partir, quero te dar
uma coisa.
Mar tirou do bolso de sua calça justa um colar
simples. Era um cordão prateado com uma concha afunilada como pingente.
- Toda vez que você quiser me ver ou precisar
de minha ajuda, aperte esta conchinha com firmeza e pense em mim que eu
aparecerei. – E entregou aquele amuleto nas mãos de sua nova “amiga”, que
olhava seu novo amigo com muito apreço.
-Muito obrigado Mar, você é realmente um homem
de grande distinção. Mas eu sou um Ser de Poder muito forte e sei me cuidar.
Estou em um corpo feminino... Entretanto sou forte! Agradeço por sua gentileza,
seremos bons amigos.
Lua virou-se e foi até outro ponto da
montanha. Guardou o colar entre os seios e levantou o pássaro preto ao alto. O
pássaro voou para muito alto e se foi. A mulher de vestido longo e cabelos
lisos olhou para traz com sua feição doce e acenou para Mar. Em seguida ela já
não estava mais ali. Havia se transportado.
Mar pulou do penhasco para dentro do Oceano.
Enquanto nadava no fundo do Oceano e se desviava dos animais aquáticos, pensava
em como gostara de conhecer Lua mais de perto. Já a tinha visto em seu
casamento e se encontrara com ela algumas vezes, mas nada tão próximo assim.
Naquele dia, a primeira vez que a encontrou informalmente, ela estava nua: bom
começo, ele pensou! Nunca pensou que a veria tão desnuda daquela forma, ela era
uma mulher lindíssima. O cheiro adocicado da mulher ainda estava gravado em sua
mente. Não, ele não estava apaixonado, não podia estar. Mas sua fascinação pela
lua, o satélite natural, era antiga. Toda noite a via pôr-se, enquanto o dia
nascia. Preferia a lua ao sol. A lua era serena e tinha uma luz clara e
prateada, era mansa, como ele. Mar estava disposto a continuar vendo Lua. Sabia
que ela tinha compromisso com outro homem, mas não custava nada serem amigos.
Estava decidido.
Dayvid Fernandes - O Autor
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